Sentia-me eufórico, paralisado. Nunca soube reagir bem a uma mangueira que esguichasse emoções por sobre o muro do vizinho. Um jato todo cheio de cores, texturas, que revezava, nervoso, com um ocasional filete, mais transparente. Pensei em comprar uma dessas pra mim; achei até, algum dia desses, que eu tinha visto uma promoção no Politeshop. Entretanto, percebi que se a dita cuja fosse minha, já não ia ser mais tão interessante.
Já vi essa mangueira diversas vezes, até mesmo quando chovia, ou quando não havia plantas. Nunca havia visto, porém, o vizinho. Ou melhor, vizinha. Foi deveras uma surpresa, ou talvez nem tanto. Não sabia a real razão de tanta água no meu quintal, na cadeira onde me sentava, na casinha do cachorro. Primeiro tive raiva, depois.. acabei entretido, ensopado.
Quebrei a cabeça, derreti a glia, bati o coração mais forte, tudo em busca de respostas. Todavia, consoante à recorrente situação das inúmeras e confusas tardes molhadas, não pude obter as explicações que eu queria. Não que fosse salvar a Terra do apocalipse, ou que me garantisse tralalá zilhões de dinheiros da mega-sena. Só queria saber o porquê dessa mangueira.
Ameacei, soquei, amassei, xinguei e... nada. Talvez meu coração fosse sinceramente ignorante, talvez eu estivesse só perdendo tempo. Desisti do meu próprio enigma, do porquê de tanto umidade. Precisei de uma vizinha teimosa para entender que, por mais desassossegada que fosse a minha índole indagativa, fui feito não para entender, nem explicar, mas sim para algo muito menos nobre, mais elementar. Nasci para me molhar.