- Desista.
-Quem és tu? De onde vem tua voz?
-Eu sou você, mas você não é eu, visto que eu sou nós,eu e você, mas você é apenas você.
-Diga-me de onde falas!
-Não falo nem digo, muito menos sinalizo ou indico. O que você codifica é um punhado de sinapses, da sua querida Inconsciência.
-Estou louco?
-Ah quem dera! Gostaria que você tivesse uma segunda personalidade, às vezes fico solitário aqui. Você está apenas cego.
-Mas eu enxergo a rua!
-Apenas a rua, não é meu caro?
-Isso é doença?
-Doença é benção, te faz humano. Você é apenas mais um reflexo dos muitos que a sociedade cria, do alvoroço do vai-e-vem. Talvez surdo então!
- Mas eu ouço as buzinas e os berros..
-Apenas isso, não é? E pare com o tu, ou tu achas que tu te salvarás do vós santanás? Fale de alma aberta, afinal sou eu que a disseco todo dia.
-O que você quer? Não entendo suas indagações.
- Claro que não entende! Você está surdo, cego, mudo e leso. Não degusta nem sente, ó insensível!
-Estou morto, então?
-Talvez, está começando a respeitar os sentidos. Você deixou de degustar a vista, tocar os perfumes, mas parece que ouvir ainda é possível, não é?
-Oi?
-Haha, brincas com o criador da sua ironia!
-Agora quem ressucita o tu és tu!
-Acredito que reintegrei sua confiança, já é um começo.
-Mas se você é o que você diz ser, então você é minha confiança também!
-Talvez. Vamos proceder ao jugalmento.
-Que julgamento?
-Nunca ouviu de algum mortal que o juiz de um homem é ele mesmo?
-Sim.. Mas então isso me torna um..
-Sim, você é réu. E eu,nós, sou júri também!
-E o promotor?
-Ah meu querido, você incrimina a si mesmo.
-Isso é um insulto?
-Não, apenas um indício de humanidade.
-Já voltou a ser confuso..
-Você acusa você mesmo de ser confuso, que engraçado! Enfim, não é verdade que você negou ajuda a um pedinte?
-Não queria incitá-lo à continuação da miséria própria.
-Mas você já ofereceu a outros.
-Não vêm ao caso.
-Caso esse em que você se encontrava estressado com a humanidade, por causa das supostas injustiças de um mundo justo que você nao merece?
-Talvez.
-Hm.
-Hm?
-É verdade que você parou na vaga para idosos?
-Uma vez, o mercado já estava fechando.
-Isso é correto?
-Não! Mas também não é errado devido às circunstâncias..
-Se não é certo nem errado, o que é isso?
-Humano!
-Protesto! Você usa sua condição humana para justificar todo e cada erro, todo e cada ato compulsivo.
-Dane-se!
-Haha, comportamento deveras humano.
-Já acabou?
-Não! É verdade que você colou em uma prova e depois negou e sentenciou a cola nas outras oportunidades?
-Mas foi apenas uma vez, e foi sem querer..
-Sem querer?
-Necessitava!
-Seu porco.
-Acusa a si própria, Inconsciência! Você provocou meus intintos acadêmicos e me forçou a isso!
-Bela desculpa.
-Mais acusações?
-Minto quando digo que você temeu a opinião alheia, desviando dos olhares e chorando contra as palavras?
-Quem não o faz?
-Ninguém.
-Então!
-Deprime a si mesmo ao dizer que você é ninguém e ninguém e você.
-Antes ser aceito que renegado.
-Não é verdade, que você flertou com várias pessoas e até se relacionou com algumas para superar uma decepção camuflada de amor que lhe ocorreu no começo dos seus hormônios?
-Sim.
-Sem desculpas dessa vez?
-Para isso, não existe.
-Digo verdades quando digo que você pediu desculpas a si mesmo em vez de pedir ao destino?
-Como assim?
-Você se arrepende por não ter tentado, quando deveria apenas se arrepender com o que desse errado.
-É humano temer.
-Temer não é desistir.
-Tanto faz, eu desisti.
-Sabia que, observando a última circunstância, poderia lhe condenar à pior pena possível?
-E qual é?
-Uma vida infeliz.
-Eu já fui condenado a isso sem saber.
-Está na hora de você entrar com um recurso na Corte dos Pensamentos então.
-Será?
-Declaro o réu livre das acusações.
-Inocente?
-Você não ouviu as condições ainda.
-E quais são?
-NUNCA mais volte aqui.
-E como eu faço isso?
-Tente a felicidade, é mais barato que um advogado chamado Freud.